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Dietas modificadas em carboidratos: implicações fisiológicas

Dietas modificadas em carboidratos: implicações fisiológicas*

Viviana Esquivel Solís1

N. D.,MSc.

Palavras-Chave: Dietas modificadas em carboidratos,dieta de Atkins,índice glicêmico.

Introdução

Diferentes modificações dietéticas são recomendadas para a prevenção e tratamento de várias doenças,no entanto,atualmente, as modificações dietéticas orientadas para a perda de peso são as de maior relevância, por se considerar a obesidade como a epidemia do século XXI.Estas modificações dietéticas, em sua maioria, populares ,sugerem, desde os dias de jejum até opções de restrição de consumo de alimentos específicos, em quantidades e combinações diferentes.A indústria de alimentos foi dada a tarefa de desenvolver alimentos modificados,a fim de atender a essas demandas,alguns deles hipocalóricos e/ou reduzidos em gordura, e até mesmo,na atualidade, encontram-se opções para indivíduos diabéticos ou que querem seguir dietas baixas em hidratos de carbono.

As dietas restritas em carboidratos têm sido amplamente difundidas por meios de comunicação coletiva.São objeto de polêmicas opiniões no contexto científico, as manifestações associadas à perda acelerada de peso e os efeitos colaterais que causam a nível fisiológico.

Os carboidratos constituem a principal fonte de energia na dieta da maioria dos indivíduos,no entanto,nos últimos anos surgiram novas teorias que contradizem o fato de que as dietas adequadas em carboidratos com 55-60% do valor energético total (VET),são ótimas para a prevenção e tratamento de doenças crônicas.

A presente revisão discute as implicações fisiológicas e clínicas da alteração no consumo de carboidratos,com o objetivo de fornecer informações científicas que permitam uma análise crítica,diante das decisões dieto-terapêuticas que gostariam de seguir ou sugerir os profissionais em saúde.

Os carboidratos na nutrição humana

Os carboidratos são a principal fonte energética da alimentação dos humanos por anos.Alguns os consideram nutrientes não essenciais,uma vez que podem ser sintetizados pelo organismo a partir de outros compostos.A quantidade mínima exigida pelo organismo para suprir as necessidades das células nervosas, os glóbulos vermelhos do sangue e da medula óssea,é de cerca de 180 gramas diários,dos quais o organismo pode sintetizar 130 gramas por dia, pelo que os restantes 50 gramas devem ser fornecidos na dieta.Recomenda-Se que entre 50 e 60% das calorias totais da dieta provenientes da oxidação dos carboidratos, no entanto,esta percentagem varia amplamente entre diferentes populações,de acordo com os seus padrões de alimentação (1).

Na Costa Rica,as mais recentes pesquisas de nutrição (Consumo Aparente de Alimentos,1997 e da Pesquisa Basal de Fatores de Risco para Doenças não Transmissíveis,Cartago,2001) descrevem que o consumo de carboidratos na dieta do costa-riquenho é de aproximadamente 60%do VET,no entanto,enfatiza-se que o consumo do açúcar simples é de 15%do VET, percentual considerado inadequado ao exceder as recomendações nutricionais de 10%do VET.O consumo de fibra dietética continua a ser inadequado,sem atingir as metas nutricionais propostas pelas Guias Alimentares para a Costa Rica,(1997),onde se recomenda um consumo médio de 25 gramas por dia (2,3).

Os principais alimentos que contribuem para o consumo de carboidratos na dieta do costa-riquenho são:o arroz,derivados do trigo (cereais, biscoitos,pães,massas,etc)e açúcar simples (2).

Dietas modificadas de acordo com índice glicêmico

O índice glicêmico mede o efeito que tem sobre a glicemia quantidades equivalentes de carboidratos contidos nos alimentos.Este índice depende dos métodos de preparação, processamento,presença de antinutrientes,tipo e quantidade de fibra e combinação de nutrientes (1).

O índice glicêmico dos alimentos foi estabelecido,de acordo com o aumento da glicemia após a ingestão de um alimento, quando comparada com um padrão definido,como por exemplo o pão branco ou a glicose.Desde 1987,Jenkins e colaboradores realizaram um estudo em jovens saudáveis, utilizando dietas com baixo e alto índice glicêmico.Eles observaram que as dietas com baixos índices glicémicos estão associados com a redução da fructosamina,peptídeo-C e o perfil de glicose de 12 horas.Outras investigações posteriores apontam a importância que tem o índice glicêmico sobre a resposta da insulina à disponibilidade de glicose dos alimentos,a qual determina a evolução de várias doenças crônicas (4,5,6).

A resposta insulínica não só obedece a composição da dieta;também foi determinado que mudanças sutis nos genes poderiam estar regulando a captação e utilização de glicose, os quais, eventualmente, poderão determinar a tolerância entre os indivíduos para os carboidratos (4).

Dietas modificadas,de acordo com o índice glicémico e a quantidade total de carboidratos,foram avaliadas para o tratamento de doenças crônicas,especificamente de diabetes mellitus, hiperlipidemia e obesidade,entre outras,sem deixar de lado o manejo clínico do paciente diagnosticado com insulino-resistência e obesidade visceral (7,8,9,10,11,12,13).

A resistência à insulina está associada com a hiperinsulinemia,a qual provoca alterações metabólicas que incidem sobre a prevalência e incidência de doenças crônicas,entre as quais se destacam:aterosclerose,hipertensão arterial, obesidade,diabetes mellitus,entre outras (1).

De acordo com Heilbronn,L. e colaboradores (2002), dietas com baixo índice glicêmico,embora com aportes adequados de carboidratos,melhoram um pouco o controle glicêmico e o metabolismo de lipoproteínas em indivíduos com baixa tolerância à glicose (14).

Por outro lado,Agus,M.(2000),avaliaram o efeito da composição da dieta de acordo com o índice glicêmico sobre as adaptações metabólicas e hormonais em que a restrição de energia.Conclui-se que,apesar de ambos os grupos reduziram de peso,o grupo que teve uma dieta com baixo índice glicêmico reduziu as concentrações séricas de leptina,uma hormona produzida pelo adiposito,participante da regulação do apetite e do metabolismo energético (15).

Um estudo realizado por com efeito,D. 1999 em adolescentes obesos,evidenciou que os que consumiram alimentos com maior índice glicêmico apresentavam maior ingestão de alimentos ou aumento do apetite,o qual está associada com que essas substâncias aumentam a secreção de insulina e, consequentemente, a epinefrina e a hormona do crescimento (16).

Franz,M. e colaboradores (2002),em seu artigo “Evidence-Based nutrition principles and recomendations for the treatment and prevention of diabetes and related complications “,enfatizam que o seguimento de dietas com baixo índice glicêmico em indivíduos com diabetes tipo 1 e 2, continua a ser controversa.Indicam que,embora o uso de dietas com baixo índice glicêmico pode reduzir a glicemia pós prandial em diabéticos tipo 2,no entanto,não existe suficiente evidência de que, a longo prazo, ofereça bene .cios a estes pacientes (17).

A experiência pessoal no manejo nutricional de pacientes diagnosticados com insulino-resistência,hiperinsulinemia e diabetes mellitus, que se lhes prescreve uma terapia dietética, que envolve não apenas o fracionamento dos carboidratos,mas também a combinação de alimentos para que a dieta seja de baixo índice glicêmico,tem mostrado grandes benefícios.As pessoas manifestam-se melhorias significativas nos indicadores do estado nutricional,mais especificamente os indicadores clínicos,antropométricos e bioquímicos,como os níveis de glicemia e perfil lipídico,entre outros.

Dietas restritas em carboidratos

Johnston,C. e colaboradores (2002),analisaram o custo da termogénese de dietas ricas em proteínas e baixas em gorduras,em relação a dietas altas em carboidratos e pobre em gorduras,evidenciando que as dietas ricas em proteínas e baixas em gorduras envolvem um maior custo de energia por termogênese,o que pode relacionar-se com um maior gasto energético em indivíduos que consomem maior quantidade de proteína (18).

Stern,L. Iqbal,N. Seshari,P. Chinao,K. Daily D. McGrory,J. Williamns,M. Gracely,E. e Samaha,F.(2004),avaliaram durante 1 ano, os efeitos de dietas baixas em hidratos de carbono (menos de 30 gramas por dia)em 132 adultos obesos com dietas restritas em calorias (cerca de 500 Kcal. ao dia e menos de 30% do valor energético total de gordura).Seus resultados indicam que o grupo com dietas baixas em hidratos de carbono, conseguiu reduzir os níveis de triglicerídeos,bem como melhorar os níveis de lipoproteínas de alta densidade.No entanto, não se observaram diferenças significativas com os outros lipídios,sensibilidade à insulina ou com o peso corporal.Parte das reações adversas observadas no estudo foram associados com um aumento do nível de azoto ureico no sangue. No grupo com dietas baixas em hidratos de carbono,foram observados distúrbios de dor no peito e até mesmo dão conta de que 2 pacientes morreram,um por vírgula desenvolvimento de diabetes mesmo e outro com cardiomiopatia isquêmica severa (19).

As dietas baixas em hidratos de carbono (menos de 30 gramas), utilizadas em algumas ocasiões no tratamento do excesso de peso,ocasionam uma diminuição da quantidade de glicose disponível, o que obriga o organismo a utilizar outros nutrientes (proteínas, ácidos graxos,e até mesmo corpos cetónicos)como fonte de energia.

Apesar de um consumo excessivo de proteínas e gorduras,o organismo não pode sintetizar ácidos graxos ante a ausência de NADP + ,produto da via pentose fosfato descarboxilase (shunt das pentoses),parte do metabolismo de carboidratos, (14),conseqüentemente, é comum observar que os indivíduos com dietas baixas em hidratos de carbono e alta em gorduras e proteínas,produzem perda acelerada de peso (massa gorda e muscular)e manifestam maior saciedade.

A baixa disponibilidade de glicose induz à utilização dos ácidos graxos como combustível metabólico,o que, consequentemente, ocasiona um aumento na produção de corpos cetónicos.No entanto,se essa situação persistir por um período prolongado,pode produzir um estado de cetose caracterizado por processos metabólicos resultantes da diminuição da insulina e o aumento da secreção de glucagon, que reduz a utilização de glicose e aumenta a oxidação de lipídios como fonte alternativa de energia e a degradação de proteínas para fornecer substratos gluconeogénicos.Isto por sua vez acompanha de hipoglicemia,tonturas, perda de peso e prisão de ventre.Apesar de alguns tecidos são capazes de se adaptar a estas alterações metabólicas decorrentes da pouca disponibilidade de glicose,este tipo de dieta é sempre associado a arritmias cardíacas e aterosclerose,já que,em geral,os carboidratos são substituídos por alimentos ricos em gordura saturada e colesterol (20,21).

Por outro lado,as dietas ricas em carboidratos com alto índice glicêmico,se relacionam com o desenvolvimento de doenças crônicas como a obesidade,a diabetes mellitus tipo 2,obesidade visceral,hipertensão arterial e hiperlipidemia,entre outras.Esta associação destina-se aos efeitos produzidos pelos carboidratos dietéticos sobre o controle glicêmico,o qual é afetado pelo índice glicêmico,de modo tal que se tenha reconhecido que alimentos de alto índice glicêmico tendem a provocar respostas metabólicas associadas com a insulina,principalmente (22,23).

Vários estudos descrevem os achados relacionados com o seguimento de dietas restritas em carboidratos para o manejo da obesidade,no entanto,apesar da modificação de alguns indicadores antropométricos e bioquímicos,enfatizam a importância de se ter um uso discricionário.Também mencionam que qualquer indivíduo que não tenha sido avaliado previamente por um médico deverá ser submetido a regimes de alimentação rigorosos ou modificados.Para além disso, todo profissional em saúde anuente a prescrição deste tipo de dieta,tem o dever ético de informar aos seus pacientes as consequências de c (mais) de seu uso.

Além das modificações na ingestão de hidratos de carbono (quantidade total e índice glicêmico dos alimentos),é importante o acompanhamento de dietas saudáveis para a prevenção e tratamento de doenças crônicas.

Recomendações gerais:

1.Manter o consumo de hidratos de carbono dentro dos limites recomendados,assim como fracionar a ingestão.

2.Consumir preferencialmente, carboidratos complexos, provenientes de frutas,vegetais e cereais de grão inteiro,e limitar o consumo de carboidratos simples e alimentos com maior índice glicêmico.

3.Combinar alimentos fonte de carboidratos com proteínas e gorduras para melhorar a resposta glicémica.

Em relação à dieta da população da costa rica,deve-se incentivar a aumentar o consumo de frutas e vegetais amplamente disponíveis em nosso país.Também deve-se recomendar evitar os excessos no consumo de carboidratos,em geral, não complexos e simples,a fim de prevenir o aparecimento de várias doenças crônicas.

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1 Professora e Pesquisadora.Escola de Nutrição.Faculdade de Medicina.Universidade de Costa Rica.Cidade da Investigação,San Pedro de Montes de Oca.San José,Costa Rica.

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